Entrevista – Paulo Fontoura

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Paulo Fontoura é o jornalista responsável pela Assessoria de Comunicação da Secretaria Estadual de Habitação, Saneamento e Desenvolvimento Urbano (Sehadur).

 

Fontoura é formado pela PUCRS (1987), Pós-Graduado em Teoria do Jornalismo e Comunicação de Massa (1998) e está cursando o Mestrado em Teoria do Jornalismo e Comunicação de Massa. Trabalhou como repórter e coordenador de produção na Zero Hora, repórter na Gazeta Mercantil, no Jornal do Comércio, na Folha de Canoas, na Rádio Gaúcha, na Assessoria de Comunicação da FIERGS, da Secretaria da Cultura do Estado do Rio Grande do Sul, da Câmara de Vereadores de Canoas, além de produtor nas Rádios Bandeirantes Guaíba e na RBS TV, entre outros.

 

Fê Cunha – Quais as diferenças entre exercer o jornalismo político e outras editorias?
Paulo Fontoura – Qualquer editoria tem as suas peculiaridades. Atuei nas editorias de Polícia (ZH), Economia (JC, ZH e GAZ), Política (ZH e Rádio Gaúcha) e esporte (Rádio Band) e em cada uma o profissional deve ter o mesmo posicionamento ético e de respeito às fontes e a informação coletada. Em qualquer lugar em que se esteja, toda e qualquer informação deve ser checada sob os mais variados ângulos e sempre devemos nos fazer a mesma pergunta: com que propósito me passaram esta informação? Quem eu vou beneficiar e quem eu vou prejudicar? E de que forma isso vai impactar a vida da “dona Maria” e do “seu João”? Personagens que são os nossos leitores e os nossos maiores críticos.
Na política as manobras são mais presentes. Nesta editoria existe o ingrediente “plantação de matéria” e os jornalistas que não percebe, pode levar a chamada “bola nas costas” a todo o instante.
Por vezes um político chega e te confessa que irá agir de certa forma, que apresentará este projeto ou critica alguém. Muitas vezes ele está jogando, aguardando a repercussão do dia seguinte. Se for positiva, ele mantém, mas se a coisa virar contra ele, ele recua e diz que foi engano do profissional, que não entendeu o que ele quis dizer ou até mesmo na versão mais surrada, dizendo que se trata de uma grande mentira.

 

Fê Cunha – Já aconteceu na prática um exemplo semelhante com o senhor?
Fontoura– Sem citar nomes, certa vez fiz uma matéria por telefone com um deputado federal que criticava a escolha do candidato a prefeito pelo partido. Por coincidência estavam sentados em frente da minha mesa o presidente municipal e o líder da bancada do mesmo partido que haviam me procurado para entregar um convite do lançamento do comitê central deste candidato. Eles acompanharam toda a entrevista, mas não quiseram se manifestar quando os acionei. Resultado: No dia seguinte recebi críticas de todos, porque o parlamentar disse de Brasília que tudo tinha sido armado para prejudicar o partido e que nem havia conversado comigo.

 

Fê Cunha – Em algum momento, enquanto jornalista político, o senhor foi confrontado com o dilema: ética profissional ou oportunidade, como propostas de matérias direcionadas e lado financeiro, por exemplo ?
Fontoura– Não separo ética profissional e pessoal. A ética, para mim, é a que trazemos do berço e é esta que utilizo na minha vida pessoal e na profissão. Já fiz uma série de matérias em que me pediram para que eu não desse seguimento, tentando me subornar e posteriormente ameaçando. Mesmo assim continuei e após seis meses de constantes matérias, tive como resultado o desbaratamento de uma operação no Estado de adulteradores de combustível e fraudadores de impostos, isso me rendeu prêmios de jornalismo estadual e nacional.

Fê Cunha – Sabemos que a política envolve muitos interesses, como o repórter consegue identificar a boa intenção do político ao passar uma informação?
Fontoura – Não existe um repórter de política que possa dizer “nunca fui manobrado por fonte”. Por mais experiência que se tenha, sempre é possível cair nas ciladas da vida. Um erro comum e que sempre causa dissabores é deixar que uma fonte passe a ser amigo ou que se admire e idolatre uma fonte, isso acaba influenciando nas decisões e acarreta em problemas e decepções.

Fê Cunha – Como editor, o senhor já foi pressionado a atender aos interesses do jornal em alguma matéria política?
Fontoura – Sim, de forma indireta do tipo deixa esta matéria para outro e pega esta que pode render manchete ou abre de página. Ou ainda, estás escalado para viajar e acompanhar tal fato jornalístico.

Fê Cunha – Até que ponto o bom off deve ser levado em consideração e qual o procedimento ideal para que ele se torne uma boa matéria?
Fontoura – Deve-se ter uma relação de respeito e distância do off, caso contrário vira refém das fontes que não assumem o que dizem. Tem autoridades que utilizam muito este estratagema. “Não fui eu que te disse, se citar o meu nome eu nego, mas o que realmente aconteceu foi…”. Resultado: tens e não tens a informação, como usar passa a ser um problema. Aquela história de usar que uma influente fonte, que não quis se identificar me passou a informação retira credibilidade da matéria. Conheci alguns colegas que usavam este expediente sem ter qualquer tipo de fonte e sim criando os fatos.

Fê Cunha – A jornalista norte-americana Judith Miller, no início foi tratada como heroína da informação, quando permaneceu presa 85 dias por não revelar uma fonte, saindo da prisão apenas quando a fonte resolveu se “entregar”. Dias depois acabou sendo, de certa forma, desmascarada por ser usada pelas fontes e também usá-las, tendo uma cumplicidade que ia além da profissional, jornalista-fonte. Até que ponto devemos proteger essa fonte que nos concede um bom off?
Fontoura – Uma vez tive uma informação privilegiada de um tema abordado numa reunião ocorrida no Palácio Piratini em que participaram cinco pessoas e só estas tinham conhecimento do assunto. Com base nesta informação realizei uma pesquisa e elaborai uma matéria que demorou um mês para ser concluída, com entrevistas com todos os lados possíveis. Esta matéria saiu e resultou num grande furo e numa reversão de expectativas por parte do governo. Lembro que o vice-governador me ligou duas vezes e procurou o diretor de redação. Ele queria um nome e não obteve. Com isso, não demiti o secretário e consegui outras informações que renderam furos e manchetes para o jornal. No jornalismo, deve-se saber respeitar e ser respeitado pelas fontes e mantê-las é vital. Mesmo fora do jornalismo diário, recebo informações das minhas fontes que trocam idéias e me pedem orientação. Isso é jornalismo.

Fê Cunha – O que o senhor acha de jornalistas políticos que em determinado momento da carreira acabam se candidatando, em eleições? É uma oportunidade interessante de ver o lado oposto ou acaba prejudicando sua imagem, quanto jornalista?
Fontoura – Existem dois lados no balcão. De um lado temos os profissionais que tem um compromisso: seus leitores e patrões. Do outro, que defende uma causa seja assessor de imprensa ou fonte. Assim como para estes casos, se na candidatura houver dignidade, ética e respeito à informação e ao que o cerca, é possível trocar de lado e até podendo retornar ao outro lado do balcão perfeitamente.

Fê Cunha – Você trabalharia na assessoria ou nos programas eleitorais de algum candidato nas eleições, caso fosse convidado? Por quê?
Fontoura – Num mercado restrito como o nosso, aderir publicamente uma campanha ou abrir o voto resulta num carimbo que jamais será descolado. Trabalhar numa campanha só se acreditasse no projeto e nas pessoas.

Fê Cunha – Quais as principais diferenças que o senhor pode citar entre trabalhar com jornalismo político, em um veículo e trabalhar em uma Assessoria de Imprensa, de uma Secretaria do Governo?
Fontoura – Em um, os jornalistas de veículos que tem como patrões os leitores, ouvintes e telespectadores. No outro, os assessores de imprensa a serviço de uma causa, além de jornalista-empresário, jornalista-autoridade, jornalista-político, etc., profissionais que também lidem com informação de interesse da comunidade.

Fê Cunha – O senhor acha que a gravação feita pelo vice-governador Paulo Feijó da conversa com César Busatto e o que agora se fala muito, os grampos telefônicos, são práticas válida na política e até mesmo para um melhor conhecimento do povo sobre certos candidatos?
Fontoura – Voltamos à ética pessoal. Sou contra a obtenção de informações de forma ilegal ou não consentida. Se todos os comentários que fizemos, principalmente de forma descontraída ou com amigos e familiares fossem tornados públicos, seriam um caos. O mesmo vale para autoridades.

Fê Cunha – O que o senhor acha da campanha Ficha Limpa, do MCCE (http://www.mcce.org.br), que recolhe assinaturas para um abaixo assinado, a fim de garantir que políticos em débito com a justiça não se candidatem a cargos eletivos?
Fontoura – Deve-se ter muita cautela e verificar que tipo de processo judicial que ele responde. Se fosse levado em consideração qualquer um, existiria ação judicial forjada para prejudicar políticos em ascensão.

Fê Cunha – Falando de campanhas políticas, a aliança Eu Quero é Mais, encabeçada pela deputada federal Manuela D’Ávila, tem um marqueteiro em sua campanha, Juliano Corbellini, que já teve experiências em candidaturas ao Senado, como a de José Fogaça, à prefeitura, com Bernardo de Souza, de Pelotas, e ao governo, com Yeda. Em contrapartida, a aliança PSOL-PV, com a deputada federal Luciana Genro, diz que uma campanha dirigida pelo marketing transforma o político em uma mercadoria, na lógica de vender um produto. O que o senhor acha desse marketing político?
Fontoura – Acho importante ter um especialista que possa fazer projeções, estabelecer cenários e derivações e que tenha desenvolvido seu conhecimento em bancos escolares. A deputada e candidata do PSOL comentou um aspecto que em muitos casos é desempenhado pelo diretor da produtora ou pelo assessor direto e não pelo profissional do marketing.

Texto de Fernando Cunha ©

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